Direito Estudantil - Constituição Poderes Públicos
Wanda Marisa Gomes Siqueira*
Os estudantes têm seus direitos assegurados no Capítulo III da Carta Magna. Os constituintes tiveram a sensibilidade de lhes garantir igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência física, atendimento em creche e pré-escola para as crianças de zero a seis anos de idade, programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde, bolsa de estudo, apoio financeiro do poder público para as atividades universitárias de pesquisa e extensão, melhoria da qualidade do ensino, promoção humanística, científica e teconológica, processos próprios de aprendizagem para as comunidades indígenas, avaliação de qualidade do ensino pelo poder público, acesso aos níveis mais elevados de ensino, segundo a capacidade de cada um, liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber.
Foram sensíveis também às reivindicações dos professores, garantindo a gestão democrática do ensino público, o pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, a valorização dos profissionais de ensino, plano de carreira para o magistério público, com piso profissional e ingresso exclusivamente por concurso.
Com tantos e significativos direitos expressos na Lex Maxima, é de lamentar que os governantes e as autoridades de ensino contrariem o sentimento dos constituintes em relação aos estudantes.
A Constituição tem sido criticada em alguns pontos, principalmente nos princípios que deverão informar a nossa ordem econômica, já que não estabelece nenhuma medida de combate aos surtos inflacionários, por exemplo.
Todavia, com relação aos princípios que regem a Educação, as maiores críticas recaem sobre o artigo 207 da Constituição Federal, que trata da autonomia universitária. Dizem os especialistas em educação que a universidade brasileira não está à altura da autonomia que os constituintes lhe outorgaram. É preciso concordar com os que assim pensam. A noção de autonomia assegurada nesse artigo não pode ser confundida com a de independência.
É dever do Estado autorizar o funcionamento das universidades, reconhecê-las e fiscalizar-lhes as atividades por meios regulares e conformes ao ordenamento jurídico.
A autonomia didático científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial deve ser exercitada com probidade e transparência. A universidade deve gozar de autonomia obedecendo aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, conforme estabelece o artigo 37 da Constituição Federal.
A autoridade administrativa que ferir esses princípios deverá ser punida, conforme o parágrafo 4º, inciso XXI do artigo supramencionado, que declara: "Os atos de improbidade administrativa importarão suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma de gradação prevista em lei, sem prejuízo da ação penal cabível".
É bom ressaltar que esse dispositivo constitucional foi regulamentado em 2 de junho de 1992, através da Lei n.º 8.429, que estende as sanções, também, aos agentes públicos da administração indireta ou fundacional, portanto, aos empresários do ensino.
Compete aos poderes públicos a observância dessa lei quando houver denúncia de irregularidades/ilegalidades praticadas por quaisquer agentes públicos da administração.
Milhares de estudantes em todo o país, estão denunciando os aumentos abusivos das mensalidades escolares, preocupados com o alto índice de evasão escolar e o crescente número de salas de aula vazias nas universidades particulares e, surpreendentemente, também nas públicas, onde sobram professores e faltam alunos. Estão exigindo um ensino de melhor qualidade, mais democrático e mais crítico.
Observado-se que os direitos constitucionais dos estudantes não estão sendo respeitados pelos poderes públicos. O descaso começa pelo Ministério da Educação, contagia secretários de Educação, reitores e membros dos conselhos de Educação. Essas autoridades, ao invés de valorizar os professores e incentivar os alunos a lutar por seus direitos, tentam a qualquer preço ? até com o uso de aparato militar ? calar a voz dos jovens que começam a esboçar suas primeiras palavras no sentido de exigir um ensino de qualidade.
Como não são ouvidos, resta-lhes bater às portas do Poder Judiciário. Começaram a bater timidamente, com medo até. Hoje já batem forte, começam a ser ouvidos. E hão de bater bem mais forte. Nasce, então, o Direito Estudantil ? não sem esforço, sem esperança, sem luta, pois segundo Rudolf Von Ihering "o fim do direito é a paz, o meio de atingi-lo, a luta". Esse direito há de vingar e se espalhar do Norte ao Sul de nosso país, para que todos saibam que estudante pensa, age e sente. Pensa até melhor do que aqueles que querem amordaçá-lo.
No Rio Grande do Sul, vários mandados de prisão foram expedidos contra reitores que, arbitrária e ilegalmente, desrespeitaram decisões judiciais em nome do poder discricionário e sob a inspiração de um direito administrativo que pretende impor a vontade do Estado em detrimento da vontade do legislador e da sociedade.
Os estudantes estão atentos. Começam a lutar por seus direitos. Já não pagam os valores abusivos cobrados pelas mensalidades escolares, fazem depósitos judiciais desses valores. Já não cursam 1000 hora/aula além das exigências legais, exigem carga horária de acordo com a estabelecida pelo Ministério da Educação, já questionam os currículos dissociados da realidade brasileira.
No atual quadro de escassez intelectual, de elitização do ensino, da ausência de um plano nacional de educação, os poderes públicos devem atender as reivindicações dos estudantes que estão a exigir que a educação seja repensada em todos os níveis para que os problemas do país sejam repensados, também.
Para onde vão os recursos destinados à Educação? Porque dezenas de milhares de crianças estão nas ruas sem qualquer assistência? Porque dezenas de milhares de estudantes são reprimidos pela polícia quando saem às ruas para protestar contra os abusos e omissões administrativas? Porque os professores não recebem o tratamento que a Constituição Federal lhes assegura? Porque o país não consegue formar profissionais capazes de buscar solução para o problema da fome, do desemprego, da inflação, da criminalidade e da corrupção.
Sem pretender exaurir o assunto, conclui-se que há excessivo centralismo, autoritarismo e burocracia nos órgãos públicos ligados à Educação. O Direito Estudantil deve receber os poderes constituídos, tratamento prioritário e especializado. Há expectativa com relação à lei de diretrizes e bases que está em vias de ser sancionada. Há expectativa, também, de que essa lei seja respeitada, para tanto é necessário que em nosso país as questões de ensino passem a ter tratamento especializado, inclusive no Poder Judiciário.
O texto constitucional promulgado em cinco de outubro de 1988 será revisado. As conquistas na área da Educação não podem ser suprimidas, ao contrário, devem ser aperfeiçoadas pelos parlamentares com a participação e vigilância de toda a sociedade.
O Brasil precisa ingressar no terceiro milênio com a cabeça erguida. Só há um caminho pelo qual poderá fazê-lo: a Educação.
*Advogada
(Publicado no Jornal do Comércio de 18/06/1993 e na Zero Hora de 23/06/1993)
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